domingo, 3 de maio de 2009

Aurora Prisma

Aurora Prisma

Quando o sol começa a cair, parece que a escuridão que toma o céu, aos poucos, toma conta da minha alma. Vem batendo uma tristeza, uma solidão. Uma vontade de olhar pro outro lado da cama e ver um rosto sorrindo. Quanto tempo não vejo um rosto sorrindo... nem meu próprio rosto sorri, e espelhos, ultimamente, não são bem-vindos. Eles me mostram a realidade que não quero ver. Teto, branco. Cama, macia. Porta, fechada. No chão, os sapatos. Na parede, um desenho. Desenho que ele fez, tão impessoal, tão frio. Olhos distantes...
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Gosto muito de observar o tom alaranjado do pôr-do-sol derramado no céu, que escurece gradualmente. Gosto de sentir a brisa e observar as primeiras estrelas surgirem. Sinto que cada uma delas sorri e pisca para mim. É um tanto piegas, eu sei, mas é meu jeito. Muitos de meus amigos e até ex-namoradas me acham grudento, meloso e até mesmo um tanto ¿afeminado¿. Afeminado por amar ao extremo e querer ser amado? Em meus relacionamentos fazer com que minha parceira seja a pessoa mais feliz do mundo é prioridade. Mas... parece que elas não gostam disso! Preferem ser rejeitadas, maltratadas do que a certeza do meu companheirismo.
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E lá vou eu de novo pensar nele, e tudo é muito inevitável! Tudo que eu olho me faz pensar nele, talvez, não por ele, mas pela falta que eu sinto dele, quem sabe, nem a falta dele em si, mas falta de alguém... Falta de um braço quente pra aquecer esse meu braço que está latejando de frio. Preguiça de me levantar e pegar um cobertor, mas, logo já tenho que sair, nem compensa levantar. Melhor manter essa posição estática, olhando o chão. Ou seria os sapatos?
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Ouvindo este CD faz com que me lembre dela... Essa música tocava em meu carro no primeiro encontro. A noite estava enluarada, algumas estrelas tímidas presenciavam aquele momento especial. Duas almas que haviam acabado de se conhecer, mas que de tão perfeitas fundiram-se imediatamente. Seria a mulher da minha vida, pensei. A mulher que me faria feliz para todo o sempre.
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Sapatos que ele me deu, antes não tivesse dado. Certeza que não foi ele quem escolheu, afinal, por que quereria ele me calçar? Calçar-me e impedir-me de pisar nos espinhos que sempre tomam o caminho, calçar pra quê? Se foi ele quem atirou os espinhos? Caso pensado.
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O ¿sempre¿....Todas as vezes ele, o sempre, foi o meu nunca. Lembro que... Ah... tudo são lembranças amarguradas...Dei-te meu coração, ofereci-lhe o mundo, vendi minha alma para não te perder, vivi por você e morreria pelo mesmo. Foram tantos sonhos a realizar. Tantos planos por fazer. Juras sem fim, promessas para todo o sempre... que terminou em nada!
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Certeza que ele me usou. Aproveitou da ingênua menina dos cabelos negros e cara de anjinho. Pensando, ele me disse uma vez que me amava, uma vez. Como se isso compensasse os outros 547 dias que se passaram sem uma palavra de carinho. Tantos dias, que o que mais precisava era um ¿você está bonita¿.
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Por que o nosso fim? Por que te amei sem limites quebrando as barreiras de minha força? Por te jurar lealdade eterna? Fidelidade e companheirismo? Agora estou aqui sem propósitos, sem saber o que fazer, dizer ou pensar. O que me resta? O nunca, o nada, a solidão e os estilhaços apodrecidos de meu coração.
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Nem isso! Depois me dizem que sofro de baixa auto-estima, e como não sofrer? Preciso de carinho, de alguém... Alguém só pra dizer que acha, não sei... que acha meus olhos bonitos, ou até mesmo que gostou da cor das minhas unhas...nem isso. Ah! Oito horas, hora de levantar, arrumar o cabelo, e abrir a porta. Inferno! Odeio abrir a porta.
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Fecho a janela e meus olhos. Espero que um dia, um toque me ressuscite. Quem sabe alguém a procura de um verdadeiro amor... Abro os olhos e vejo ao meu redor. Tudo está no mesmo lugar, nada mudou. Percebo que a cada dia que passa o mundo vai perdendo sua cor, e que meus sonhos estão envelhecendo. Sigo até a porta, olho para o relógio: já são oito horas. É hora de espairecer... É hora de tentar viver...
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Ela se levanta da cama, e segue em direção a porta, não estava muito interessada em ir ao encontro dos amigos, mas pensava que poderia ser uma possibilidade de esquecer, ao menos por minutos, a torrente de lembranças que tomava seu quarto, e sua mente. Ele entrou no carro, decidido a deixar o passado para trás, bateu a porta e aumentou a velocidade, querendo chegar ao destino o mais rápido possível. Apesar de não conhecer metade das pessoas que estariam na festa, achava que seria uma distração ao menos.
Enquanto caminhava ela olhava as estrelas, pareciam até capazes de sorrir, o sorriso que ela havia esquecido, chegou, cumprimentou a todos e sentou-se em uma cadeira próxima a varanda, era melhor manter distância de tudo.
Ele chegou quieto, disse um ¿oi¿ a alguém sentou mais adiante, e parou próximo a porta. Parecia tudo muito parado, pessoas desconhecidas, ambiente novo, a idéia de mudança pouco a pouco era afastada, pensava que era melhor ter ficado em casa. Atraído pela idéia de se afastar de todos, foi em direção da varanda, com a idéia de ver as estrelas sorrirem mais uma vez.
- Oi.
- Oi.
O silêncio, e a timidez tomaram conta. Ela sentada, com as mãos apoiando a cabeça. Ele em pé, mãos no bolso, olhando para cima.
- Será que vai chover?
- Chover? Imagina! Não vê como as estrelas sorriem?
Ela olhou espantada. E achou estranho alguém ter notado que as estrelas, naquele momento, eram as únicas capazes de sorrir.
- É, parecem sorrir sim.
Ele resolveu olhá-la, não havia mostrado interesse em fitar a mulher que estava sentada, isolada de tudo e de todos. Moveu a cabeça, e expressou um leve sorriso.
- Gostei da cor do esmalte.
- Ah. Gosto de preto.
- É diferente.
Mais uma vez ela se espantou com a capacidade que o homem tinha de reparar nos pequenos detalhes, pensou em diversas coisas para comentar, inúmeras frases ilógicas passaram por sua cabeça, mas nenhuma acabava por sair. Ele olhava para todos os lados, sem saber direito o que fazer, ou comentar, a timidez sempre fora sua antiga companheira.
- Sempre vem aqui? Sair com esse pessoal?
- Sempre? Ultimamente o sempre tem sido nunca...
Inevitavelmente, ele soltou um leve riso, e a fitou.
- O que foi?
- Não. Nada. Só... nada. Engraçado.
- Ah. Sim.
- Sempre assim.
A conversa que gradualmente ia perdendo as amarras, é interrompida, três ou quatro amigos, interessados na brisa gelada da noite juntam-se ao casal. O assunto é interrompido. Ela entra, acompanhada por uma amiga. Ele permanece ali, bebendo algo com alguém. O pouco que resta da noite, passa rapidamente, e logo lá estava ela andando pela rua, olhando as estrelas e pensando em um certo sorriso. Ele espera alguns minutos, olha por toda a casa, não encontra o que procura, entra no carro. Pensa que as noites deveriam ser mais longas, e que as estrelas deveriam ser as mesmas que sorriam, naquela momento, para uma pessoa especial, que quem sabe, ele tornaria a ver.

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